Ele é um dos principais estudiosos brasileiros da era digital e do futuro. Gil Giardelli é professor e difusor de ideias inovadoras e super inspiradoras. Um perfeito mudador. Ele criou, entre muitas outras coisas, um mestrado de gestão de mudança e transformação digital para ajudar a indústria brasileira a encarar os desafios do século XXI, leva executivos para fazerem imersões em universidades estrangeiras como Stanford e MIT, onde é professor convidado, dá aulas de futurismo, economia digital e inovação em diversos centros acadêmicos brasileiros (como Insper, PUC/RS, Fundação Dom Cabral), é conferencista em eventos como TEDx … e por aí vai …. Ele não para. Mas encontrou um tempo para dar uma entrevista para a gente, no polo de inovação social Civi-co, em São Paulo. Foi uma conversa longa, impossível falar pouco com tanta informação e tanto entusiasmo. Mas nós resumimos aqui alguns momentos marcantes da entrevista, que você pode ver completa no nosso youtube: www.youtube …

Gil Giardelli

Gil Giardelli Foto: Facebook

Sociedade em rede

Gil Giardelli: Se a primeira fase do mundo digital é se conectar pela rede, agora a gente começa o que a gente chama de conexão natural: as pessoas vão sair mais para as ruas para se manifestar, para fazer pic-nic…

Durante um tempo, a gente pegava o leproso da nossa cidade e mandava para a Amazônia, a gente pegava o louco da nossa vila e mandava para um sanatório, e agora, no século XXI, na sociedade em rede, a gente vai entender que os problemas estão aí e que a a gente pode resolver isso juntos.

É muito marcante uma frase de professor amigo que diz assim: Nessa nova era da sociedade em rede, nenhum de nós é tão inteligente quanto todos nós juntos. Quando a gente entende essa frase a gente muda o conceito de relacionamento, muda tudo.

Se antes houve uma globalização dos commodities, do dinheiro, agora a globalização vai ser do ser humano.

Brasil e futurismo

Gil Giardelli: De todas as grandes economias, o Brasil é o único que não tem uma cadeira de pensamento do futuro ligado ao governo. Existe o Ministério do Planejamento, mas que pensa em 4, 8 anos no máximo. E nós precisamos de pensamento a longo prazo para que não haja um caos no transporte, na segurança …

Precisamos entender que o futurismo é uma ciência exata. Tudo o que está acontecendo hoje foi visto lá atrás.

Ser humano e inovação

Gil Giardelli: Eu acho que vai chegar um momento em que não vamos precisar mais trabalhar tão pesadamente, vamos viver em uma Atenas digital. Dizem que antigamente, em Atenas, as pessoas se dedicavam mais aos temas humanos, à filosofia, à ciência, ao estudo da matemática.

Eu acho que neste mundo onde não temos tempo para nada vai sobrar tempo para olhar no fundo do olho da outra pessoa, para entender que são das ideias opostas que nasce a inovação, que quanto mais pessoas diferentes mais inovação vai existir.

O freio na inovação é quanto a gente deixa alguém de fora.

Terceirização de problemas

Gil Giardelli: Eu gosto da filosofia oriental que diz: “vamos mudar o mundo sim, mas antes varra a sua rua.” As pessoas transformadoras pensam no grande, mas elas cuidam do pequenininho.

Eu incentivo os meus alunos a fazerem trabalho voluntário, de qualquer tipo. Essa atitude é o grande pensamento do século XXI.

Tecnologia

Gil Giardelli: A tecnologia é apenas um palco. A maior inovação hoje, por exemplo, é como a gente está voltando a ser o ser humano humanista.

A era sem fronteiras

Gil Giardelli: Tem duas coisas que já estão acontecendo e serão muito marcantes nesta nova era.

Primeiro que já começou a ser vendido a um preço bem acessível no exterior um tradutor de línguas que demora somente milésimos de segundo para traduzir do inglês para o chinês e do inglês para o espanhol (e vice-versa).

A outra u chamo de Blockchain e começou com o bitcoin. Quando você tem um Blockchain você desafia duas exclusividades do governo: os exércitos e a emissão de dinheiro.

Esquerda e direita

Gil Giardelli:  Muitas palavras que usamos ainda hoje são da época da Revolução Francesa e da primeira Revolução Industrial: esquerda, direita, aristocracia, salário, classe operária… São palavras que não cabem mais.

O ser humano pode ter várias nuances durante o dia. Tem hora que ele pode ser mais tradicional, mais liberal, mais esquerda, mais direita. Estes estereótipos são coisa do século retrasado. E a gente vai evoluir nisso.

Um país do futuro

Gil Giardelli: Tem um país que eu destaco que é a Coréia do Sul. Eles passaram por uma guerra entre as Coréias e o sul-coreanos fizeram um pacto social que diz assim: as próximas três gerações vão trabalhar muito, mas a quarta vai viver em um mundo pleno. O país está hoje entre os mais inovadores do mundo.

China

Gil Giardelli: Eu participei de um debate na Inglaterra com uma pessoa que representava a China, mas não era do governo, e eu perguntei: “o que levou a China a mudar 600 milhões de pessoas da linha da pobreza para a classe média?” E ela me respondeu: “Nós entendemos como sociedade que todos prosperarão, alguns primeiro do que outros.”

Educação

Gil Giardelli: Existe uma pesquisa que diz que apenas 2,5% dos jovens brasileiros desejam ser professores. Eu gostaria de dizer que você não precisa ser professor  numa sala de aula, você pode ser um educador na vida, dando bons exemplos.

O mundo nunca precisou tanto de educadores.

Eu acho que quando a gente colocar a educação como ponto principal, a gente vai fazer coisas fantásticas. E eu posso dizer que existem milhares de brasileiros fazendo coisas bacanas.

Sejamos otimistas. Eu concordo que parece uma tempestade, mas dizem os sábios navegantes que sempre depois de uma tempestade vem dias maravilhosos. Nossos dias estão chegando…

A pior prisão que existe é quando você não dá a educação necessária.

Robôs

Gil Giardelli:  Os robôs não vão nos dominar. Eu sou de uma escola chamada Tecnotismitas, que é formada por quase 90% das pessoas que estudam robôs.

Hoje 81% das pessoas que trabalham ou odeiam o que fazem ou trocariam seu trabalho neste exato momento. Essa insatisfação mostra que o formato de trabalho (e de educação) foi uma das poucas coisas que não mudou radicalmente nos últimos tempos.

Sob o olhar do século passado, uma pessoa que trabalha melhor de madrugada, que não gosta de acordar cedo, é um vagabundo. Mas a produção das pessoas é diferentes. O LAB do MIT, por exemplo, funciona 24horas. Esse limite de tempo e espaço concreto acabou.

O ser humano se sente feliz quando está conversando, aprendendo um com o outro. O trabalho repetitivo? Vamos deixar os robôs fazerem.

Todo trabalho é muito nobre, mas nem todo trabalho te dá propósito, motivação.

Nosso grande desafio é essa transição e vai sobrar emprego, só que serão empregos diferentes.

Saúde

Gil Giardelli: Um pool de universidades, lideradas pelo MIT e por Harvard fez a engenharia do bebê perfeito, que tecnicamente, vai viver com muita saúde por 200 anos. Mas no máximo 1% da população mundial pode pagar alguns milhões para ter acesso à essa tecnologia. O problema desse processo é viver em um mundo dividido entre quem pode pagar isso e quem vai morrer por falta de saneamento básico. E hoje ainda existem quase 2 bilhões de pessoas vivendo sem saneamento básico, cerca de 1,6 bilhão de pessoas que não têm energia elétrica. Esses são os nossos desafios.

 A tecnologia é muito bacana, o problema é que se não tiver ética você cria um novo tipo de eugenia, o que justificou as atrocidades dos nazistas. A ética coletiva é inegociável.

Inserção social

Gil Giardelli: Eu acredito que a inserção dos negros, de qualquer minoria, que na verdade não são  minoria, virá pela educação de alto impacto. Na minha opinião, o Brasil esta errando por colocar o dinheiro nas universidades. A gente tem que colocar na primeira infância.

Existe um documentário maravilhoso feito no Brasil chamado “O começo da Vida” que mostra que os primeiros 3.000 dias de uma pessoa é o que vai definí-la como ser humano.

Então eu acho que a gente precisa investir na educação de básica. Esse vai ser o caminho para fazer a inserção.

Ética

Gil Giardelli: A gente esta vivendo no Brasil o que os humanistas chamam de colapso da ética.

A pior coisa que pode existir para uma sociedade é quando você vê alguém muito poderoso cometendo erros sem ser punido. Isso cria uma insegurança porque a pessoa que está lá embaixo fala assim: se ele que teve todas as acusações não está preso eu também vou roubar a galinha do vizinho.

Este colapso da ética está em tudo: mais de 60% das carteirinhas de estudante são falsificadas.

A gente precisa fazer um pacto sobre a ética novamente.

Jeitinho brasileiro

Gil Giardelli: O jeitinho brasileiro para coisas boas é o melhor jeitinho que tem. Tanto que as escolas de negócios do mundo todo dizem que precisamos aprender com a empatia dos brasileiros e sempre foi ao contrário: diziam que não se podia ter tanta amizade, relação pessoal…  Agora isso está mudando.

Na livraria de negócios mais famosa do mundo, a de Harvard, os 4 livros mais vendidos no ano passado são de uma série que se chama  “O lado humano da vida profissional”.

Mídias sociais

Gil Giardelli: As mídias sociais tem o chamado efeito túnel, quando você só valida suas ideias com quem pensa como você.  O confronto de ideias de forma inteligente é muito bom para o aprendizado.

Especialistas X generalistas

Gil Giardelli: Hoje as pessoas precisam ser especialista em algo, mas precisa ter uma visão holística do mundo, precisa entender de pessoas. O PIB intelectual é hoje a maior riqueza de um país e a gente é muito rico nisso.

Homens x robôs 

Gil Giardelli: O que difere a gente dos robôs e nos vai dar prosperidade  é exatamente a criatividade, a empatia.

O que muda tudo 

Gil Giardelli: Eu gosto muito da seguinte frase: no século XXI não use velhos mapas para descobrir novas terras. É uma nova humanidade, uma nova terra, uma nova sociedade …  e os mapas antigos não cabem mais.

Veja no Muda Tudo nossa matéria sobre o filme O Começo da Vida, citado pelo professor Gil Giardelli:

https://mudatudo.com.br/entrevistas/o-comeco-da-vida-e-da-sociedade/