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Desde outubro, quem digita www.utopiar.com.br se depara com um site lindo, com lenços esvoaçantes em tons de azul, estilo tie-dye ( na verdade, a técnica usada se chama Shibori). Maior vontade de clicar e comprar. E a vontade aumenta mil por cento quando você entende do que se trata. Um projeto para fazer com que mulheres vítimas de violência doméstica gerem renda e consigam mudar de vida. A ideia saiu das cabeças de Renata Rizzi e Beatriz Duarte, em 2017.

Beatriz Duarte e Renata Rizzi, fundadoras da Utopiar
Beatriz é formada em desenho industrial com pós-graduação em administração na Nova Zelândia e master em gestão de sustentabilidade na FGV (Fundação Getúlio Vargas) de São Paulo. Antes de abrir a Utopiar, trabalhava na área de consultoria em inovação.
Renata formada em comunicação, trabalhou em uma ONG ambiental e passou anos no mundo corporativo como responsável pelo marketing da Swarovski da América Latina.
“Eu comecei a sentir um vazio, sem saber o que era, até que eu conheci o conceito de negócio de impacto social, que permite usar essas duas ferramentas que eu carregava comigo para resolver um problema da sociedade. Eu achei isso genial. E a grande inquietação dentro de mim era com a situação das mulheres, porque eu adorava o meu trabalho, mas eu via que as mulheres nunca chegavam ao topo. Aí eu vi um dado que foi o grande divisor de águas: 50% dos lares brasileiros tem algum tipo de violência doméstica. “
Renata explica que existe um ciclo de violência, que normalmente começa com a psicológica, quando o agressor coloca a vítima para baixo, sem encostar um dedo nela, sem nem levantar a voz. Depois vem a verbal, quando o parceiro começa a gritar com a mulher, intimidar a parceira. Em seguida vem a violência moral, quando ele começa a difamar a mulher com amigos e familiares. Depois vem a violência patrimonial, com a quebra de objetos, e por fim a sexual e física, que pode levar à morte.
“As mulheres têm vergonha e medo de denunciar o abuso e muitas vezes elas são consideradas culpadas por serem agredidas. Imagina quanta energia as mulheres perdem com isso? A queda de produtividade que elas têm no trabalho?
Renata e Beatriz começaram a estudar o assunto e a buscar uma solução para mulheres em situação de violência doméstica.
“Existe todo um ecossistema de ajuda para essas mulheres, mas eu percebi que não tinha ninguém gerando renda para elas e sem renda elas não podem sair daquela situação. A gente quer que a mulher seja livre para bancar a própria escolha. “
O background de moda era excelente para desenvolver uma atividade para mulheres. Mas a vontade era de que o produto fosse também de baixo impacto ambiental. E a Beatriz tinha tudo a ver com isso.
“A indústria da moda gera muito impacto ambiental e social negativo, desde a matéria-prima que utiliza até a questão trabalhista. Fora o volume do que é produzido: 53 milhões de toneladas de fibras para desenvolver o setor têxtil no mundo e 50% desse volume, em um ano, vai para o lixo por causa do fast fashion. E menos de 1% é reciclado de fato. Sem falar na química do processo produtivo e nos micro plásticos do poliéster, que são liberados durante a lavagem. Não adiantava pensar em um produto que fosse bom para as mulheres e ruim para o meio-ambiente”, afirma Beatriz.
A Indústria têxtil emprega 1,7 milhões de pessoas no Brasil diretamente ( são 8 milhões de empregos indiretos), sendo 75% desse total formado por mulheres, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Têxtil. O país é o quarto maior produtor de roupas do planeta e a maior cadeia têxtil completa do ocidente, cadeia que envolve desde a produção das fibras, como plantação de algodão, até os grandes desfiles de moda, passando por fiações, tecelagens, confecções.
Beatriz e Renata se juntaram e começaram a desenvolver lenços, tomando cuidado com cada etapa do processo. Primeiro, elas compram tecidos certificados, como o algodão orgânico. Depois, entregam o tecido a uma oficina de costura para fazer os lenços. Em seguida, os lenços são levados a uma oficina de mulheres que fazem as dobras e amarrações em uma associação, onde elas têm apoio psicológico para conseguir sair do ciclo de violência doméstica.
“A nossa meta é ser a solução de renda para essas mulheres. Nós queremos trabalhar inclusive em abrigos sigilosos, que são espaços para mulheres que correm risco de morte,” diz Renata.
“A gente faz muito advocacy do combate à violência doméstica e da sustentabilidade. Então o nosso negócio tem esse papel ambiental, social e cívico,” completa Beatriz.
A produção da Utopiar começou em outubro de 2017. No primeiro momento, o tingimento era feito por elas próprias com índigo vegetal na cozinha da casa da Renata, que lembra o trabalho feito em um panelão de fazer cerveja:
“Durante dois meses foi impossível cozinhar lá em casa. Fora o varal que foi montado no banheiro. Isso até a gente conseguir terceirizar o tingimento. “

A primeira venda foi realizada em dezembro de 2017, durante uma feira. Depois, as duas passaram a vender em uma multimarca e hoje vendem também pelo site. Até hoje foram cerca de 1.000 echarpes produzidas e a primeira coleção de peças de roupas, com shorts, camisas e calças, já está à venda, conta Beatriz na maior animação:
“Nós oferecemos a nossos clientes também a opção de alugar os produtos por 15 dias, por exemplo, e só depois desse período ela decide se vai comprar ou não.“
As mulheres que fazem as amarrações e dobras ganham 10% do valor da venda. Se uma echarpe custa 220,00, ela ganha 22,00. E mesmo quando o produto não precisa da amarração, a Utopiar faz uma doação para a ONG para que possa continuar acolhendo mulheres vítimas de violência.

As duas consideram a mudança para o CIVI-CO um movimento super importante.
“Vir para o CIVI-CO, em julho, foi muito importante para dar energia para a gente, abrir a cabeça, sentir que as coisas estão rolando e que a Utopiar está viva e está no mundo. Empreender é muito solitário, muito difícil. E estando no CIVI-CO a gente vê que tem mais gente nessa montanha-russa, sobrevivendo e aproveitando essa jornada.” completa Renata.
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